01 janeiro 2012

Na cabeça do cliente

Por: Vitor M. Trigo
vitor.trigo@gmail.com
http://lugaraopensamento.blogspot.com/
01 Janeiro de 2012




Por longos anos se formaram vendedores para que estes controlassem a forma de pensar dos clientes. Também embarquei nessa via que resultava dada a falta de informação dos clientes em muitos domínios, bem como por força da carência de alternativas no mercado. Foi o primado dos fornecedores sobre os clientes, em que o instrumento transaccional por excelência era a técnica de vendas. Os laboratórios criavam produtos e às vendas competia colocá-los, convencendo os mercados que deles necessitavam. Há quem chame a este período o império dos fornecedores – “Os clientes podem escolher a cor (do célebre Ford-T), desde que seja preto”, dizia ostensivamente Henry Ford. Seguiu-se-lhe o reinado do marketing, em que se pretendeu conduzir o cliente ao desejo compulsivo de comprar. Nas empresas, a Gestão das Vendas cedeu lugar à Gestão da Procura, nas palavras de Philip Kottler.

Complicaram-se as coisas para o lado dos vendedores. Já não bastava “ter jeito para vendas”, quase sempre confundido com facilidade de expressão e de objecção. De súbito, novas padrões de competências (soft skills) como a relação com os clientes baseada na criação de confiança, na transparência e na honestidade, na gestão de expectativas, e na escuta activa, haveriam de se revelar indispensáveis.

Em vez de tentarem conduzir o raciocínio dos clientes em determinado sentido, os vendedores passaram a preocupar-se em entender os caminhos lógicos que os clientes utilizavam nos processos de decisão.


O que influencia mais a decisão


Quando o cliente já se considera suficientemente informado para poder decidir, a tomada de decisão torna-se simples e, em regra, é rápida. Mas, nem sempre é assim. Imaginemos os seguintes óbices, muito habituais:

• Existem várias alternativas;
• O investimento é elevado;
• A credibilidade do vendedor não é suficiente;
• Os intangíveis são significativos;
• É a primeira decisão neste domínio;
• As especificações da solução envolvem alguma dúvida;
• Não há referências sobre a solução;
• Não estão claros todos os custos em causa.

Qualquer destas situações gera climas emocionais pesados, e complica o processo de decisão. É possível, no entanto, lidar com estas dificuldades de forma eficaz. Fundamental é entender em que fase do processo o cliente se encontra, pois qualquer delas exige actuação específica. Considerar, por exemplo, os seguintes estádios facilita muito a nossa missão:

Fase I: Identificação da necessidade
Fase II: Procura de soluções
Fase III: Selecção da melhor solução
Fase IV: Quantificação da proposta
Fase V: Assinatura do acordo
Fase VI: Acompanhamento e avaliação da solução implementada

Ambas as partes devem colaborar em todas as fases, pois é assim que se gera confiança, partilha decisões, cria relação futura. Saliente-se que cada fase comporta duas componentes: Identificar a necessidade – Mudança e Insatisfação; Procura de soluções – Pesquisa e Identificação das Ofertas; Selecção da melhor solução – Estudo e Comparação; Quantificação da proposta – Custos e Benefícios; Assinatura do acordo – Riscos e Compromissos; Acompanhamento e avaliação da solução implementada – Expectativas e Realidades.

É fundamental que o vendedor tenha consciência de todos os passos deste processo, e seja flexível e competente na abordagem a cada um deles.


O vendedor é um actor


1. Como “Estudante” – estuda a aproximação ao cliente

Todas as mudanças geram oportunidades. Os vendedores que seguem esta ideia são, em regra, premiados. Os melhores vendedores focalizam-se no cliente em vez dos produtos que representam. Por vezes até são considerados como parceiros e consultores dos seus clientes, e o segredo que utilizam chama-se informação tão detalhada quanto possível acerca dos seus clientes e características dos mercados onde operam.

2. Como “Médico” – atenta em pormenores, descobre grandes necessidades

A insatisfação pode avaliar-se pela distância que decorre entre o que se tem e o que se gostaria de ter. Quantificar esta lacuna torna-se mais fácil quando o vendedor tem perspicácia para identificar pequenos nadas que significam muito para o cliente. É a táctica de observar sintomas para perceber as causas escondidas. A boa notícia é que é possível desenvolver metodologias de detecção de sintomas. Os bons vendedores preocupam-se em perguntar o que preocupa os clientes no domínio de custos e benefícios, sede da maioria das necessidades ocultas, para assim poderem preparar a prescrição ideal.

3. Como “Designer” – arquitecta uma solução competitiva

Indicar a melhor solução técnica não chega, é preciso que ela seja competitiva e sustentável. O bom vendedor define os limites do combate com os seus concorrentes, partindo do conceito global para a solução específica, afastando contra-argumentações e prevendo objecções. Para que a estratégia funcione, o passo que foi designado como “estudante” é crucial. O designer tem de ser visto como especialista, o que significa conhecimento sobre o cliente, seus mercados, e concorrentes, para além de ser encarado pelo cliente como um verdadeiro profissional de vendas.

4. Como “Coach” – auxilia e apoia o cliente

Os clientes sentem-se muitas vezes confusos quando comparam as diversas ofertas que os diferentes vendedores lhe apresentam, até pela terminologia que cada um utiliza. Nestas alturas, os futuros decisores sentem-se indefesos, temendo tornar-se presas fáceis. Pedir auxílio a quem desconfiam não é, de facto, fácil nem parece aconselhável. Contudo, quando desde início e com base em experiências passadas, um vendedor consegue tornar-se “Coach”, então disporá de uma imensa vantagem competitiva – as emoções são mais fortes que as razões. Esta aproximação permite igualmente afastar as discussões centradas nas características dos produtos, e, tão ou mais importante, da questão dos preços. Por outras palavras, os trabalhos distanciam-se da análise de características e descrição de funções, orientando-se para a quantificação de benefícios a colher – o que o cliente ganhará se concordar com a proposta, e o que deixará de ganhar se a rejeitar.

5. Como “PSI” – conforta pensamentos e afasta receios

Contornar emergências é sempre preferível do que ser surpreendido por ameaças não perspectivadas. A isto, os decisores chamam gestão de risco, e todos desejam praticá-la a fim de os evitarem. Quando o vendedor consegue partilhar este caminho com o seu futuro cliente, sabe que a sua proposta está quase ganha. Esta relação não é, contudo, fácil de alcançar – envolve observação e sensibilidade apuradas, identificação prematura de preocupações e medos, discussão aberta de alternativas, e elevado grau de resiliência, pois antes de decidir quase todos os clientes parecem regredir equacionando fortemente a possibilidade de desistirem da decisão. É habitual o vendedor ter de reassumir o papel de “Médico” sem hesitações. Se assim for, os cuidados colocados em 2, devem ser reforçados.

6. Como “Negociador” – recorda e confirma os benefícios mútuos

Os termos e condições do futuro contrato constituem fortíssimo factor de decisão. Eis algumas das razões que podem tornar inviável o que parecia ser uma proposta tecnicamente perfeita: (1) Custo insuportável; (2) Preço muito superior aos concorrentes; (3) Encargos que não cabem no orçamento do cliente; (4) Demasiado tempo para implementação; (5) Valor dos benefícios a recolher superam os encargos a suportar. É por tudo isto, que os vendedores eficazes sabem que devem auscultar os futuros clientes em todas estas áreas, certificando-se que na altura da entrega da proposta formal para adjudicação, o cliente não objectará nestes campos. Esta metodologia, comum a todas as filosofias CRM (Customer Relatioship Management), designa-se por inquérito às Condições de Satisfação dos Clientes (Conditions of Satisfaction – CoS). Para que esta aproximação resulte, o vendedor deve ter permanentemente presente nos contactos com o cliente: Necessidades (atenção que podem variar ao longo do estudo), Alternativas, Tempo, Relacionamento, Encargos, Disponibilidade, Credibilidade, Conhecimentos, e Competências (Skills). Nada de truques nem habilidades.

7. Como “Contratante” – formalizando o acordo

É normal que na fase de discussão da proposta formal, surjam acertos de pormenor, por vezes até algumas concessões. Nada deve ficar combinado, tudo deve ser passado a escrito. O contrato final não deve ser um apêndice à proposta e seus anexos, mas sim um documento completo e autónomo, se bem que podendo apelar a articulado descrito na proposta.

8. Como “Parceiro” – acompanhando a implementação

Reconquistar um cliente que se perdeu pode custar até cem vezes o que custa obter uma nova encomenda dum cliente satisfeito. Por isso acompanhar a implementação dum acordo se tornou tão importante no trabalho constante dos vendedores. Ao fazê-lo os vendedores sabem que estão a alimentar a relação, controlando a gestão das expectativas dos clientes. Em simultâneo, vão refinando o seu conhecimento acerca dos padrões de exigência dos seus interlocutores, detectando novas oportunidades de negócio.


Novo Paradigma nas vendas?


Os compradores estão cada vez mais conhecedores das suas reais necessidades, da sua força negocial, e dos benefícios que podem recolher da crescente concorrência dos mercados e das modernas tecnologias que suportam os diversos canais de distribuição. Os fornecedores revelam por seu lado maiores pressões sobre os preços e as condições contratuais, chegando a referir-se à lealdade às marcas como uma miragem. As empresas sabem, por isso, que só investindo na qualidade dos seus vendedores podem enfrentar os novos desafios. Entre as principais deficiências apontadas pelas empresas aos seus vendedores encontram-se: Inabilidade na comunicação, carência de conhecimentos básicos e específicos, excesso de agressividade, ausência de sentido de urgência e de compromisso, e recurso a promessas irrealistas.

A opção por filosofias estandardizadas de vendas, com base informática e estrutura processual, é um caminho quase que óbvio para eliminar desvios indesejáveis. É claro que os vendedores não gostam deste tipo de aproximações, argumentando que o campo criativo fica muito reduzido. Mas, na verdade, não é isso que deverá acontecer. Pela drástica eliminação de tarefas burocráticas, definindo o que deve ser conseguido em cada fase do processo comercial, a força de vendas deverá ficar mais liberta para aplicação das suas capacidades e conhecimentos específicos, ganhando portanto eficácia.

Aos gestores de vendas compete explicar o novo paradigma, as novas necessidades, as novas posturas, e as oportunidades acrescidas que decorrerão do novo posicionamento das suas equipas. Este é um trabalho prévio à implementação de qualquer nova filosofia, e condição crítica de sucesso.

É fundamental que os vendedores entendam que a visão imediatista não constrói relações futuras. Aliás, tão pouco é visão, não passa duma imagem. É preciso que acreditem que lhes compete acrescentar continuadamente valor nas relações com os clientes. Eles, os vendedores, são o instrumento crucial desta filosofia.

O crescimento sustentável das organizações que servem está refém desta mentalidade. E as suas carreiras dependem da forma como evoluírem como profissionais de elevada credibilidade.

04 dezembro 2011

O cliente NÃO tem sempre razão

Por: Vitor M. Trigo
vitor.trigo@gmail.com
http://lugaraopensamento.blogspot.com/




Na verdade, “o cliente tem sempre razão” ajuda muito a introduzir qualquer recém-chegado à equipa de vendas. Incute respeito pela missão de vendas. Os mais experientes usam o mito no processo de socialização. Os directores, mesmo que não concordem (por mim falo), não reforçam a ideia, mas deixam-na passar.

Os novos vendedores na ânsia de brilhar, e pressionados pelo objectivo de manter os clientes satisfeitos, tendem a cair na armadilha de tentar responder positivamente a pedidos irrealistas. E quantas vezes os clientes pedem impossíveis, umas vezes porque se posicionam como predadores dos fornecedores, outras por não terem real noção do que na realidade precisam.

A experiência encarregar-se-á de mostrar a estes ultra-voluntariosos prestadores de soluções que o segredo da satisfação de clientes está, acima de tudo, na correcta gestão de expectativas. Mas a experiência carece de tempo. A formação comportamental destes novos profissionais torna-se assim crucial ao seu êxito e ao desenvolvimento das organizações que servem.


Ajudar o cliente a perceber o que lhe faz falta


Por vezes os clientes não sabem explicar o que pretendem. Noutras alturas não conseguem mesmo entender o que necessitam. É claro que não admitem uma situação nem a outra, muitas vezes de forma deliberada não vá o fornecedor perceber a sua falta de conhecimentos na área, ou a extrema urgência que têm para resolver a questão em aberto. Os bons vendedores lidam bem com estes ambientes, tornando-se rapidamente conselheiros do candidato à compra.

Há, no entanto, que perceber a enorme distância que decorre entre “o cliente tem sempre razão” e “normalmente o cliente não sabe o que quer”. Posicionar-se correctamente entre os dois extremos, deslizando circunstancialmente mais para um lado ou para outro, define o talento do vendedor. O lema é “só se justifica prosseguir a negociação se ambas as partes retirarem benefício da transacção”. Não respeitar este princípio é correr graves riscos de insucesso.


Perceber o processo de decisão do cliente


A publicidade encarrega-se de nos convencer de que temos necessidade de algo. O marketing procura levar-nos a desejar colmatar essa necessidade através de determinada solução.

O vendedor experimentado sabe que, desde o mais cedo possível, tem de identificar a necessidade do cliente, o que o cliente valoriza (condições de satisfação), o que o cliente ganhará com a solução e o que perderá se não a implementar, quem na organização sairá beneficiado no novo cenário, e quem considerará que a adopção da solução a propor pode representar ameaça.

Além disso, é óbvio que tem de estar seguro de poder responder ao pedido em condições lucrativas, mas essas são questões internas.


A arte de negociar


Valorizar exclusivamente os aspectos tangíveis duma proposta é meio caminho andado para o insucesso. As transacções comerciais não são somente racionais. Por incrível que possa parecer é preciso “valorizar os intangíveis”. Gerir as relações emocionais é fulcral sempre que se visa, para além da presente venda, a criação dum ambiente de confiança que facilite novas vendas no futuro. “Dá-lhe (ao cliente) exactamente o que ele pede e não terás problemas” não é posicionamento recomendável.

Ao contrário do que os maus vendedores pensam, o processo de negociação não é o passo seguinte à apresentação da solução. A negociação inicia-se no momento em que se discute qual é o problema, situando-o em limites razoáveis e exequíveis, controlando as expectativas desde os primeiros momentos. Melhor dizendo, a negociação ao iniciar-se desde os primeiros contactos, permite acordar as dimensões das questões a endereçar, em lugar de mergulhar num pântano de indefinições irrealistas ou de duvidoso custo-benefício.

Alguns princípios assumem-se como factores críticos de sucesso:

• Fornecedor e cliente consideram-se, pelo menos no início, com interesses antagónicos;
• Evitar posições “certo” e “errado”. Ambas as partes consideram que estão certas, e, não raro, que os outros estão errados;
• Nunca admitir promessas, ou mesmo expectativas implícitas, de elevado grau de incumprimento;
• É objectivo da presente transacção criar condições para futuros relacionamentos.


A importância da qualidade


O único juiz capaz de definir se um produto tem qualidade é o cliente. Ponto. Experimente explicar a uma criança que a McDonalds não tem qualidade e irá ouvir das boas (assumindo que a criança se sente à vontade para dizer o que acha). É claro que não estou a defender que a qualidade intrínseca dos produtos possa ser negligenciada. O que quero afirmar é que essa qualidade intrínseca não garante a satisfação do cliente. A noção de valor atribuída pelo cliente é que condiciona a opção de compra e a consonância cognitiva subsequente.

Significa isto que entre os skills mais importantes do vendedor se encontram os dotes de escuta activa e o potencial empático, o que significa grau elevado de Inteligência Emocional, tal como Daniel Goleman e Richard Boyatsis a definiram.


Consideração final


Que não se conclua, pela leitura apressada do título deste texto, que a opinião do cliente possa ser negligenciada. Como foi mencionado, os bons acordos cimentam-se em convergência de interpretação das questões colocadas e das soluções adiantadas.

O acordo ideal é o que consiga alcançar todas as expectativas geradas. E, mais do que isso, que seja possível monitorizar a evolução dessas expectativas.

Cooperação, Manifestação de Inteligência Colectiva

Por: Vitor M. Trigo
vitor.trigo@gmail.com
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A formiga no carreiro

Definir Inteligência como a capacidade de interpretar o mundo e transformá-lo em benefício próprio é mais ou menos consensual. Mas há que atender que a alteração do ambiente estimula os outros para reacções individuais e colectivas.

Eminentes académicos (p.e. Pierre–Paul Grasse, citado por Gordon, sd), reputados centros internacionais (p.e. MIT), e outros estudiosos (p.e. Leonel Moura e Henrique Garcia Pereira, 2003) debruçaram-se sobre os comportamentos dos insectos, e em particular das formigas e das térmitas, procurando recolher informações que ajudassem a explicar estas influências.

As formigas, se bem que se deslocando aleatoriamente em busca de alimento, marcam o percurso com feromona, a fim de assegurarem o regresso ao ninho. Ao encontrarem comida, reforçam a marcação, evidenciando a importância dessa rota. Desta forma, as marcações que não forem reforçadas perderão, por evaporação, a importância atribuída e passarão a ser desconsideradas. É um autêntico trabalho probabilístico de decifração do caminho mais aconselhado através da intensidade de feromona inalada, e sem dúvida uma inequívoca manifestação de feedback positivo, a que todos os elementos dedicam particular atenção.

Um fenómeno curioso ocorre com a descoberta de atalhos. Também neste meio, muitas vezes são as minorias que se encarregam de descobrir as melhores soluções, que progressivamente vão sendo experimentadas por mais indivíduos, até que todo o grupo decida adoptá-lo como preferencial.


Insectos sociais e pessoas humanas


Precisemos do que estamos a falar. Existem cerca de 900,000 espécies de insectos vivos catalogados, dos quais cerca de 2% são considerados sociais, compreendendo todas as formigas e térmitas, e algumas abelhas e vespas. As formigas representam 50% dos insectos, e colonizam a Terra há 100 milhões de anos. O Homo Sapiens fá-lo somente há cerca de 50 mil anos.

Vale a pena procurarmos averiguar “como e porque” as formigas sobrevivem há mil séculos.


A questão do mapeamento cognitivo


A grande diferença entre os humanos (extensível aos mamíferos) e os insectos sociais está na localização dos mapas cognitivos. O mapeamento cognitivo humano reside no que se designa por mente, ao passo que nos insectos sociais parece assumir carácter essencialmente colectivo. Eis a grande questão: Se conseguirmos descodificar o funcionamento deste tipo de inteligência colectiva, poderemos incrementar significativamente as nossas capacidades cognitivas.

A linguagem humana, na forma superior que lhe conhecemos, poderá contudo constituir o principal obstáculo a ultrapassar. A superior utilização de que dela fazemos na estruturação social do poder é eminentemente individual. A boa nova é que, apesar disso, a inteligência global dos grupos pode superar a soma das inteligências individuais dos seus elementos. E quando entendemos isso não hesitamos em recorrer a atributos alheios para proveito próprio.


Os objectivos humanos superam as metas quantitativas


Os humanos não limitam, porém, as suas preocupações à busca do maior resultado possível. Inúmeras metas qualitativas definem as atitudes humanas. De entre elas relevam a cultura, o bem-estar, a moda, ou a educação.

Mas não se pense, contudo, que a feromona nos é indiferente. Ela é, por exemplo, responsável pela atracção sexual humana, situando-se o seu centro nevrálgico de tratamento a nível da pituitária, que, como se sabe, é uma fonte preferencial de informação para o hipotálamo, ou seja, para as vias cerebrais superiores como lhes chama Daniel Goleman (2006).


Inteligência Colectiva e Novas Tecnologias


As ciências da computação procuram hoje desenvolver algoritmos que expliquem que possam simular os comportamentos não humanos, em especial no mundo dos formigueiros, e deles retirarem ensinamentos. Refiram-se, a título de exemplo, os projectos de Vida Artificial (aLife) que procuram reproduzir em laboratório a complexidade dos modelos biológicos, os algoritmos genéticos de selecção natural, ou os sistemas auto-organizados das colónias de formigas.

O estudo e representação computorizado do processamento da feromona, desenhando montes e vales, e acentuando e dissipando alternativas possíveis sobre os modelos artificialmente construídos, poderá vir a constituir significativa contribuição para a explicação e previsibilidade dos comportamentos sociais.

A www (vulgo Internet) é o paradigma mais actual do que se entende por Inteligência Colectiva. Inúmeros internautas, em especial a comunidade científica mundial, esforçam-se por partilhar conhecimentos sem reservas, apenas pelo prazer e pelos benefícios intrínsecos da partilha numa louvável iniciativa de geração de Inteligência Colectiva.


As baias da suboptimização


É surpreendente analisar o que acontece quando, após a descoberta do caminho ideal e da consequente auto-organização do formigueiro, este é confrontado com um atalho artificialmente construído. A colónia parece ficar prisioneira da sua própria descoberta, só esporadicamente optando pela nova alternativa, mesmo apesar desta poder ser mais vantajosa.

Que semelhança com as teorias de Herbert Simon acerca da limitação das tomadas de decisão humanas – as nossas decisões são restritas à quantidade de informação de que dispomos.

Para as formigas, a grande limitação é a quantidade de feromona a que conseguem aceder. E para nós, qual é?



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REFERÊNCIAS

GOLEMAN, D. (2006): Inteligência Social, A Nova Ciência do Relacionamento Humano, Lisboa – Temas e Debates, Actividades Editoriais Lda.

GORDON, D. (sd): Collective Intelligence in Social Insects, AI Depot http://ai-depot.com/Essay/SocialInsects.html

MOURA, L., Pereira, H. (2003): Aprendendo com a Stigmergia, a Auto-organização e as Redes de Cooperação, Paper apresentado em CHALLENGES 2003 -III Conferência Internacional sobre Tecnologias de Informação e Comunicação na Educação Centro de Competência Nónio Séc. XXI da Universidade do Minho
http://www.lxxl.pt/babel/biblioteca/chal.html

03 dezembro 2011

Inovação e Estratégia

Por: Vitor M. Trigo
vitor.trigo@gmail.com
http://lugaraopensamento.blogspot.com/




A inovação quando vai ao encontro das necessidades dos mercados materializa comercialmente a invenção. Vai, portanto, para além desta constituindo-se como vantagem competitiva sustentável.

Os negócios sempre dependeram da inovação. Os estudos sobre organizações de sucesso indiciam que os resultados operacionais de maior relevo estão associados a estratégias que estimulam a criatividade, e que passam pelo alinhamento entre visão, estrutura, e disponibilidade de meios – a estratégia inovadora deve ser esculpida no modelo de negócio, na definição de mercados alvo, e em apropriadas tácticas de actuação. Mais, todo este processo deve ser continuamente avaliado e adaptado às diversas envolventes em jogo. Por fim, mas não despiciente, todos os níveis da estrutura devem cooperar, de forma consistente, na implementação desejada, através do perfeito conhecimento dos papéis reservados a cada função.


Gerar inovação


Nas organizações com fins lucrativos, a inovação espontânea é acidental. As empresas quando querem explorar a inovação como vantagem competitiva sustentável tratam-na como sistema frágil que é, carente de alimentação contínua e cuidada, e elegem-na como factor crucial da gestão.

A visão cartesiana de tratar as partes para promover o todo, como metodologia, não se aplica. O sistema tem de ser globalmente entendido e requer gestão criativa, sistemática e proactiva da organização global, de acordo com o papel de cada componente. Numa empresa complexa, que concebe produtos e os comercializa, podem identificar-se diferentes níveis de participação:

• Nível I – Concepção, desenvolvimento, e construção dos produtos;
• Nível II – Logística que suporta as funções do Nível I;
• Nível III – Gestão operacional de primeira linha;
• Nível IV – Nível executivo (de topo), responsável pela definição de valores, políticas, objectivos de longo prazo, e estratégias.

É sobre esta estrutura que actua o Sistema de Gestão da Inovação, preocupando-se com questões como o desenvolvimento dos graus de confiança, clima de construtiva honestidade e salutar convivência cooperativa, e disponibilidade de informação permanentemente actualizada sobre os parceiros de negócio (fornecedores, clientes, concorrentes). É desta forma que se torna clara e evidente a ligação da inovação com as oportunidades de mercado, tornando-se inequívoca a focalização da organização, e de todos os seus membros, no cliente.


Estimular a criatividade


Se a inovação é importante para a organização, então todo o seu sistema de gestão deve reflecti-lo, e os gestores têm de pautar as suas actuações em conformidade. O primeiro passo a dar é assegurar que entre as habilidades (skills) dos gestores se encontra a motivação para o desenvolvimento e estímulo à criatividade. A Gestão pelo Exemplo adquire estatuto de imprescindibilidade.

A cultura organizacional pode ser um óbice. Culturas fortes e tradicionais (“Isto sempre deu resultado, e vai continuar a dar”) podem inviabilizar os desígnios inovadores. Entre os principais pilares, que podem tornar-se obstáculos, contam-se:

• A flexibilidade é fundamental, e os seus mais perigosos inimigos são o perfeccionismo e a micro gestão. Posto de outra forma, metas circunstanciais e objectivos com futuro podem, com facilidade, tornar-se conflituantes. Um outro entrave habitual é a pressão financeira orientada para o curto prazo;
• Formação e desenvolvimento são indispensáveis. Não se pode encarar esta componente com perda de horas de trabalho e despesa – trata-se de investimento. A formação transversal assume grande importância no entendimento da razão de ser de toda a estrutura;
• Comunicação é factor crítico. Mesmo uma excelente estratégia se não for bem comunicada arrisca ser incompreendida, quando não boicotada.


O poder da informação


O excesso de informação pode ser prejudicial, até pela perda de tempo que acarreta e pela desconcentração que provoca. Mas, a falta de informação também pode ser nefasta. Há, por isso, que tratar de organizar a informação. Critérios a seguir?

• A informação deve ser estruturada de acordo com a estratégia, e deve ser capaz de crescer com ela;
• Um roteiro possível será a segmentação de acordo com os mercados;
• Toda a informação supérflua ou desactualizada deve tornar-se arquivo morto;
• O critério mais importante para classificação da informação é a utilidade;
• Devem estabelecer-se nível de segurança (poucos) e quem os pode usar;
• Todo o sistema deve ser simples, claro, e de fácil manutenção.


Suportar e premiar os inovadores


Numa organização que quer ser inovadora, a inovação deve ser estruturante na definição de políticas e práticas. Tal significa que todos os intervenientes têm uma palavra a dizer sobre o assunto, em particular, os que detêm responsabilidades sobre gestão de pessoas – chefes directos e departamento RH. Eis um guião de auto avaliação que permite augurar bons resultados:

• “A minha actuação respeita sempre os valores preconizados sobre confiança, clareza, flexibilidade, equidade, sinceridade, e honestidade?”;
• “Apoio e defendo a formação como investimento?”;
• “Premeio a ousadia, aceito o erro, apoio iniciativas não directamente produtivas?”;
• “Encorajo a cooperação e apoio a resolução de problemas?”
• “Desafio as práticas instituídas pelo departamento HR?”;
• “A minha equipa sente-se estimulada para a criatividade?”;
• “ Na minha equipa a competição é exclusivamente prática de exterior?”

Este roteiro podia e devia ser mais abrangente. Mas a ideia principal é enaltecer os benefícios da auto reflexão. Um gestor conservador e acomodado jamais poderá liderar equipas inovadoras. Ao contrário, mata-as.


Liderar a inovação


Já referi os perigos da análise excessivamente discreta dos modelos, tornando muitas vezes restrita ou impossível a visão de conjunto. Uma forma eficaz de acompanhar o desenvolvimento dos processos inovadores é a utilização de ferramentas Balanced Scorecard, que permitem análises cruzadas de objectivos de negócio, desenvolvimento de pessoal, situação financeira, e conformidade estratégica.

A indispensável visão holística torna a gestão de empresas inovadoras ainda mais complexa, essencialmente porque muito mais dinâmicas. Sem dúvida. Mas as vantagens competitivas sustentáveis podem nascer como cogumelos.

Na Era do Conhecimento não explorar de forma sistemática o conhecimento, a criatividade, e a inovação, não faz qualquer sentido.

02 dezembro 2011

Inteligência Colectiva

Por: Vitor M. Trigo
vitor.trigo@gmail.com
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Inteligência Colectiva – o que é?

Por vezes oiço dizer: “Esta organização é mesmo muito inteligente”. Julgo que a frase equivale a “O comportamento desta organização é normalmente inteligente” ou algo equivalente, pois as organizações não têm comportamentos – evidenciam resultados. Se estes forem bons, aprovamos e admitimos que resultam de iniciativas inteligentes. Se forem maus, não hesitamos em apelidá-los de estúpidos, ou algo pior.

Ora, a grande vantagem das organizações é o aproveitamento sinergético das inteligências individuais envolvidas, ou seja, que a resultante evidencie mais do que a soma das inteligências parcelares. Faz todo o sentido, portanto, reflectir sobre Inteligência Colectiva como um dos construtos mais promissores em ambientes complexos e multidisciplinares, que se tornaram norma a partir do momento em que os clientes, aqui mencionados em sentido lato e não só mercantil, passaram a recusar as peças e exigir soluções.

O conceito de Inteligência Colectiva surge assim como uma forma de inteligência que emerge da colaboração e competição de vários indivíduos, situando o seu estudo na sociologia, nas ciências computacionais, e nos comportamentos grupais.


Qual o impacte da Inteligência Colectiva?


Cada vez mais, mesmo questões aparentemente elementares sugerem conhecimentos e capacidades multifacetadas e pluridisciplinares – numa palavra trabalho em equipa. Os rasgos (insights) individuais continuam a ser fundamentais, sem dúvida, e pensar o contrário seria ignorar uma parte crucial da condição humana, com um custo a pagar deveras significativo.
Mas, em ambientes grupais, a capacidade de produção de novas ideias pode alcançar níveis tais que ultrapassem as melhores estimativas do grupo, e até as expectativas dos próprios indivíduos emissores, muitas vezes surpreendidos com as suas próprias ideias. Esta é uma óptima imagem do que significa o termo Inteligência Colectiva, que pode ser importante nexo causal de dramáticos incrementos nas performances organizacionais.

Nesta perspectiva a Inteligência Colectiva encerra e potencia superiores níveis motivacionais (a paixão pela tarefa é um bom exemplo), sentido de propriedade (ownership), e auto-estima individual e colectiva.


Inteligência Colectiva e Pensamento em Grupo


Pensamento em Grupo (Groupthinking) pretende descrever o esforço grupal na procura de consensos que permitam a aproximação de posições divergentes e ao entendimento colectivo que possa suportar a obtenção dos objectivos finais.

Inteligência Colectiva, por seu lado, é o fenómeno que explica que ideias nunca antes consideradas, passem a ser partilhadas por outros membros, após a sua expressão, por todos os elementos da equipa.


Inteligência Colectiva em ambiente de mudança


Assim sendo, e uma vez aceites tamanhas virtudes, coloca-se a questão: Como será possível apoiar e incrementar a Inteligência Colectiva no sentido da mudança, da criatividade e da inovação, sem que o habitual Pensamento em Grupo, eminentemente lógico, vertical, e orientado para o curto-prazo, interfira negativamente no ambiente de pensamento lateral e complementar, como diria Edward de Bono?

A solução passa pela confiança e pelo compromisso. Só níveis superiores de confiança libertam ambientes que facilitem a livre expressão de ideias e opiniões e a interpelação e desafio constantes da verbalização alheia. O compromisso, que neste contexto não pode ser confundido com nenhuma espécie de resignação, submissão ou obediência, refere-se aos contractos psicológicos que interliga os membros no sentido de consciencialização do interesse colectivo, dos valores complementares que cada um aporta e da dependência de todos em relação a todos – “Se é bom para o grupo, é bom para cada um de nós”.


A Inteligência Colectiva como estado de espírito


A Inteligência Colectiva só encontra espaço para progredir no seio de equipas reais, e não em grupos circunstanciais. O papel do líder torna-se assim fundamental. Sempre que, na formação dos grupos, existirem de forma clara interesses e objectivos partilhados, respeito mútuo entre os membros e interdependências bem conhecidas e aceites, estarão reunidas as condições para o florescimento da Inteligência Colectiva. E uma vez experimentada, esta dinâmica não terá limites.

A Inteligência Colectiva não é um processo funcional, nem um estado de espírito exclusivamente racional. Lida com relacionamentos intra e interpessoais, comportamentos, atitudes e outros atributos que se encontram no domínio do que se costuma designar por Soft Skills, de entre os quais releva a Inteligência Emocional.

Ao líder do grupo competem as cruciais contribuições de eliminar as primeiras barreiras de confiança, a criação do espírito de grupo e a contínua alimentação do prazer pelo desconhecido, pelas novas ideias, pela aceitação da divergência e da contestação, pela relativização das opiniões, e pelo primado dos interesses em prejuízo das posições.

Trabalho e Emprego

Por: Vitor M. Trigo
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Sagres, num qualquer fim de tarde do último quinquénio do século passado. O local era um daqueles incaracterísticos cafés da histórica e simpática vila onde tradicionalmente passava férias havia vinte anos. Como era hábito, a nossa tertúlia encontrava-se para fazer boca para o jantar. Entre os poucos amigos presentes nesse dia estava o Luis, ex-pescador artesanal, encarado pelo fisco como profissional por conta própria. Luis era homem de cultura popular, vivo de raciocínio que nem insigne académico.

Carlos chegou com um grupo de acompanhantes que não conhecíamos. Eram seus colegas professores universitários. Aproximou-se de nós e procedeu às apresentações:

- Luis, este é o Sr. Doutor X, este é o Sr. Doutor Y, (e por aí fora); Meus amigos, este é o Luis, nosso amigo pescador aqui na vila.

Luis, ágil de raciocínio como era habitual:

- Oh amigo Carlos, você ainda me há-de explicar porque é que os seus colegas são Srs. Doutores e eu não sou Sr. Pescador.

Silêncio geral.


A sociedade construída em torno do trabalho


De facto, para onde quer que nos viremos, o estatuto profissional supera os direitos de cidadania. É provável que o leitor não tenha atribuído grande significado ao estatuto que o trabalho confere. Proponho-lhe que reflicta sobre dois exemplos:

Porque será que algumas profissões, terminada a chamada vida activa, se consideram jubiladas enquanto outros são reformados?

Porque será que um cidadão ex-militar continua conhecido pelo seu ex-título castrense? Encontro as seguintes explicações possíveis: clarificação do nível de ascendente sobre as massas anónimas e, por inerência, indiferenciadas.

Contudo, a situação mais brutal passa-se com os desempregados. A sociedade que naturalmente deveria entender a condição de desempregado como vítima de autêntico flagelo, tende a tratá-lo como marginal, indigente, e parasita.

O trabalho, de necessidade para sustentar a vida, e dever universal como contributo social, assumiu-se como identitário. Se duvida, experimente num qualquer quiosque de atendimento, responder à questão “Profissão?” com “Não tenho”. Repare na reacção do atendedor – provavelmente fixa-lo-á incrédulo, resistindo a perguntar-lhe algo de menos próprio. Mas, se o leitor se identificar como advogado, provavelmente passará a ser tratado por “Senhor Doutor”, e, se responder que é engenheiro, o mais certo é que o seu interlocutor se esqueça do seu nome e o trate por “Senhor Engenheiro”.


Funções sociais do trabalho


É pelo trabalho que as pessoas acedem ao circuito produção-distribuição-consumo. A inserção do indivíduo nesta cadeia, ou melhor, o seu posicionamento em cada um destes estádios é o principal factor de repartição de rendimento individual.

Noutra dimensão o trabalho assume papel de agente secundário de socialização, de produtor e regulador de relações interpessoais.

Para além disto, o trabalho é o grande organizador de tempos e espaços sociais quotidianos.

Em suma, o trabalho é fundamento de legitimidade social. A pequena história que iniciou este artigo ilustra bem em conclusão. Foi exactamente por isso que aqui a partilhei.


Funções económicas do trabalho


Pelos rendimentos do trabalho os indivíduos adquirem autonomia financeira, mas também ideológica e moral. Dir-se-á, então que o trabalho é vertebrador da actividade pessoal, fonte de estatuto, guião de papéis, e de identidades.
O estatuto profissional e as responsabilidades a ele inerentes facilitam percepção de utilidade pessoal na sociedade, bem como o desenvolvimento de aspirações, expectativas, e planos pessoais, e a experimentação dum vasto leque de emoções acerca do pensamento auto referencial.

Poderá, assim, concluir-se que é o trabalho que modela o indivíduo, condicionando a sua relação com o meio, através das capacidades económicas que lhe confere. Comentador mais frio poderá até concluir que mais do que é, o trabalhador impõe-se pelo que tem ou revela ter.


Estabilidade laboral e crises de mercado


As crises acontecem quando as evidências herdadas, chamemos-lhes legado, se tornam subitamente questionáveis, dificultando o devir que se julgava definido.

Ora, se nos recordarmos que o modelo de produção, desenvolvimento, e acumulação, remonta a Henry Ford, parece legítimo questionar se assim a sociedade actual se encontra em condições de garantir a integração de todos os cidadãos, nomeadamente os que dependem das suas capacidades para trabalharem por conta de outrem.

Colocando a questão doutra forma: Se o trabalho vier a perder a características vitais de valorização social e orientação moral dos cidadãos, será que poderemos pensar que estamos perante o fim da sociedade baseada no trabalho, ou mesmo considerar que esta será uma fatalidade histórica?


A exclusão social como norma?


Os meios de comunicação social e os agentes políticos esforçam-se por difundir a mensagem que os detentores do capital preferem: A actual dinâmica de modernização, associada aos avanços tecnológicos, e às consequências da globalização, não é assunto conjuntural, antes indício de profundas e inevitáveis alterações estruturais. O novo modelo social está em construção. Esqueçam os paradigmas anteriores.

Dito de forma diferente – A precarização do emprego é, de facto, o processo fulcral à evolução do capitalismo moderno, regido pelos novos ditames tecnológicos e económicos.

Legítimo será então pensar que, salvo profunda alteração dos modelos construídos durante o século XX, estaremos à beira dum mundo gerador de excluídos sociais. Haverá sistema de protecção sustentável que possa suportar tão nefasta realidade?


Como será o trabalho no futuro próximo?


Assumindo que a sociedade continua em evolução sem revolução, ganha forma o seguinte panorama:

• Trabalhos (no plural) em vez de emprego;
• Generalistas ganhando terreno aos especialistas;
• Obsolescência recorrente das competências exigirá formação contínua;
• Valores e princípios tornar-se-ão cada vez mais efémeros;
• Face às novas leis laborais, a segurança profissional não passará de mito;
• Cada pessoa terá em média 6 a 7 contratos de trabalho ao longo da vida activa;
• Idade mínima para reforma acompanhará a esperança de vida média da população.

Este é um óptimo desafio de reflexão para o qual desafio o leitor.

Permita-me um conselho: Seja criativo, pois, mesmo assim, correrá altíssimo risco de vir a ser surpreendido pelo futuro.